AILTON ELISIÁRIO
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O RELÓGIO DO PILATES

 

               Semanalmente faço duas sessões de Pilates no Aero Fit de minha sobrinha Irenilda Helena. Ela é quem me acompanha, me ensina, me conduz nos exercícios. Seu trabalho não se restringe a realização das aulas com o devido e adequado acompanhamento, ele vai mais além, pois penetrando no aspecto geral da saúde do aluno, observa sua disposição física e mental, a sensação de dores e alívios, o progresso corporal e se completa com as orientações dadas para serem seguidas em casa.

            Cada aula tem a duração de 50 minutos, preenchidos com os mais diversos tipos de exercícios, movimentos e respiração, com ou sem a utilização de equipamentos ou acessórios, sempre sob a atenção vigilante de Irenilda e debaixo do tic-tac de um relógio que se acha pendurado na parede. O relógio, porém, tem sido causa de comentários dos alunos que, vez por outra, provocam Irenilda para aplicar-lhe algumas sessões de sua atividade fisioterápica, a fim de promover-lhe o movimento circular de seus ponteiros, impedindo-lhe o repouso extremado que lhe tem sido peculiar.

            Quando iniciei o Pilates, o relógio na parede era redondo, branco e tinha ponteiros negros. Alguns dias trabalhava, outros não. Mesmo com as suas energias renovadas, pela substituição de suas fontes de energia, não assegurava com permanência sua função, de modo que as aulas corriam sem que seus ponteiros acompanhassem com regularidade o ritmo dos movimentos dos alunos em seus exercícios. O relógio ali estava, mas não dava conta do recado à falta de constância em seu trabalho.

               Certo dia, foi ele substituído por outro similar. Presente de um dos alunos, quando Irenilda falara em encaminhar-lhe ao conserto. Foi uma alegria geral na classe, todos agora crentes de que teriam o tempo medindo-lhes a duração dos exercícios com efetividade, além de ter ele dado nova imagem ao recinto, pendurado na parede branca ocupando o lugar do seu antecessor. O novo relógio, mesmo portando o formato redondo do anterior, era o inverso daquele, tendo os seus ponteiros brancos girando em sua circunferência negra.

               O substituto assumiu o seu posto com ares de que havia chegado pronto a cumprir sua missão. Mudou a visão do lugar em que estava, transmitiu a impressão de poder, a passagem de seus ponteiros impulsionava mais os alunos nos exercícios para sua realização em harmonia com ele, aflorando o seu domínio do tempo no ambiente agora sonorizado com seu vigoroso tic-tac.  A cada tic-tac do relógio um movimento em cada exercício, sintonia fina com o tempo em movimento. No relógio negro ficou a lembrança do relógio branco, a saudade de um e a alegria efusiva do outro, o aumento da intensidade do ritmo dos exercícios na renovação do símbolo das horas.

               De repente, a sonoridade do novo relógio sumiu e o silêncio invadiu a sala do Pilates. Os alunos se desordenaram e como autômatos paralisaram os movimentos. Irenilda apressou-se em reordenar os exercícios reaquecendo o relógio, mas o relógio não reagiu, ficou inerte, mudo, sem forças, perdido no tempo que imaginava dominar. O relógio negro parou após tão pouco tempo de haver começado o seu trabalho. Mas o trabalho do Pilates deve continuar. Irenilda sorri, reaviva o ar pesaroso dos alunos pela perda do novo relógio e adota em definitivo outro relógio, o do coração.

             Os movimentos agora devem seguir as batidas do coração, não mais o tic-tac do relógio. E os exercícios se recompõem, os alunos se reanimam, a intensidade dos movimentos se acelera, o ambiente se renova e todos respiram novos ares. O relógio parou e o tempo passa, mas é preciso caminhar. O relógio se foi ontem, o tempo se vai hoje e o caminho irá sempre se abrir.

Ailton Elisiario
Enviado por Ailton Elisiario em 08/07/2022
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