INEFÁVEL AMOR DE AVÔ
Há anos que escrevo minhas crônicas e meu irmão Hamilton tem o imenso prazer de editá-las em “power point”, criando os recheios de som e imagem para sua leitura, além da forma que faz variar em suas apresentações. Ele é o maestro que põe arranjos na música. Aqueles que me leem apreciam o trabalho assim publicado, dizendo-me do prazer da leitura pelo conteúdo e mais ainda, pela guarda mental permitida em razão da apresentação sonora e visual. A fixação da leitura torna-se perene pela imagem e som que enriquecem o texto.
Até então, nunca o agradeci de público por esse carinho, embora sempre o tenha feito pessoalmente por ocasião da edição de cada uma delas. Mas, por costume, tenho feito meus elogios às pessoas através das minhas crônicas, quando surgem oportunidades que me aguçam a sensibilidade e que meu coração pulsa fogosamente em externa-la. Já fiz isto com tantos parentes e amigos e hoje me chega a oportunidade de fazer tendo por homenageado o meu irmão Hamilton.
Segundo da escada filial de Seu Joca e Dora Irene, militar da Marinha de Guerra do Brasil, singrou os mares imensos em submarinos e contratorpedeiros, sem jamais esquecer suas origens da Hollywood Nordestina onde nasceu. Reformado, fixou-se na Rainha da Borborema. Hoje, no limiar das 8 décadas de vida, é acometido de súbito infarto, que o levou em poucos instantes não só rememorar toda sua existência, sua família da qual chegou a se despedir e de seus irmãos, mas entre as dores físicas do peito e angustiosas da alma, a temer por não ter em seus braços Sophia, sua recém nascida netinha até aquele instante ainda não abraçada.
Postando no “whats app” ele disse: “o que por várias vezes tentei contar e não consegui, tantas coisas que passaram naquele momento de angústia, desespero, sofrimento, mas sem medo, pois tinha algo comigo que me dava uma segurança extra e diferente (sem explicação) naquele momento tão sofrido, lembrando e vendo a agonia de minha família; e eu me lembrei que se eu partisse, partiria sem ter pego ainda em minha neta Sophia. Aí as lágrimas desceram, que ainda não tinham descido com o infarto. Era isso que tentei contar aos meus. Por isso decidi escrever, porque ainda não dá para contar. Obrigado, Senhor, Divino Espírito Santo e Nossa Senhora Aparecida. Não quero elogios e nem tampouco críticas. O que escrevi veio de dentro do meu coração infartado”.
Meu irmão disse que por ocasião do infarto não sentiu medo, porque havia algo nele inexplicável que lhe dava segurança, mesmo diante do sofrimento de sua família. E de certo, houve. Houve o amor de Deus. O amor de Deus que o sustentou, mas que também o levou à saudade. Sim, não houve medo, houve saudade. Saudade do amor que ainda não pudera transmitir à Sophia, sua netinha recém-nascida. Saudade do amor que, embora dado a todos os seus familiares, estava incompleto por ainda não ter chegado àquela criancinha. E chorou.
É aqui onde reside minha homenagem, não obstante meu irmão haver escrito que não queria elogios. O avô em vias de despedir-se pela gravidade da lesão cardíaca, chorando não pela dor do coração dilacerado pelo infarto lhe retirando a vida, mas dilacerado pela tristeza lhe retirando a vida sem lhe ter dado a oportunidade de haver acariciado em seus braços, se quer por uma única vez, a sua mais nova netinha. Que cena dolorosa e sublime! O choro pela dor de não ter podido expressar amor.
Hamilton, Deus em sua bondade lhe concedeu a felicidade de abraçar e beijar Sophia, como você já o fez com as outras netas. Sua esperança no momento de dor venceu o infarto e Deus o abençoou afastando-lhe do golpe de foice da Parca. Não foi, pois, desta vez que a Parca teve sucesso, porque o amor de Sophia foi mais forte e porque “a graça e a misericórdia de Deus são para os seus escolhidos” (Sabedoria, 4, 15).
Assim, a Morte não lhe tendo cortado o fio da vida, esse choro por Sophia o fez unir mais ainda a todos, mulher, filhos, netos e demais membros do seu clã, tendo por elo esse pequenino ser que, na sua inconsciência e inocência, irradiou amor no coração infartado do avô.
Meu Irmão, quero agora que produza esse novo “power point”, desta vez carregado com as tintas de suas próprias emoções. Sua neta amada, seu coração infartado, sua tristeza, suas lágrimas, sua esperança, sua dor, sua fé, sua vitória, foram os elementos que expuseram a todos a grandiosidade de sua alma e a magnífica pessoa humana que você é, tornado com este grave infarto exemplo indelével de amor e fé para todos nós. Salve, José Hamilton de Souza!
Ailton Elisiario
Enviado por Ailton Elisiario em 04/12/2017